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O Trabalho e o Futuro do Brasil

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Artigo
Mônika Bergamaschi
Presidente do Conselho Diretor da ABAG/RP
Presidente Executiva do IBISA


Conte até 10. 

Enquanto você executou esta ação tão simples, setenta novas ações trabalhistas deram entrada na Justiça do Trabalho em algum lugar do país. Simples assim. E isso, se forem computadas as 24 horas dos 365 dias do ano. Se esta conta for feita considerando apenas as horas úteis das portinholas vinculadas, o número será ainda mais estarrecedor.

O Brasil é, infelizmente, detentor de mais um triste e preocupante recorde: é o país que reúne o maior número de reclamações trabalhistas. Pior do que isto... é o país que possui mais ações trabalhistas do que o resto do mundo somado. Valendo a máxima de que contra fatos não há argumentos, eis um sinal mais do que claro de que alguma, ou muita coisa, está errada por aqui.

A Consolidação das Leis do Trabalho, CLT, completou 74 anos no dia 1º de maio de 2017. É a mais antiga e a mais rígida do mundo. O Brasil também é o país que mais ratificou normas da OIT, Organização Internacional do Trabalho. 

É sempre bom lembrar que as leis trabalhistas foram criadas com o intuito de defender os interesses dos empregados. Mas, desde o seu nascedouro, remendos ainda mais populistas vêm sendo agregados, resultando em um amontoado legal, gerador de insegurança para os empregadores e uma ameaça aos postos de trabalho. 

Não bastassem os penduricalhos de lado a lado, há ainda cerca de duas centenas de projetos de lei, convergentes e divergentes entre si, tramitando no Congresso Nacional. Em cada um deles, proposições diferentes sobre infinitos temas: jornada exaustiva, horas in itinere, trabalho análogo ao escravo, terceirização, menor aprendiz, calor, cotas, saúde e segurança do trabalhador, negociado sobre o legislado, insalubridade, etc etc etc. 

Muita coisa mudou nestas sete décadas, sem que a legislação se modernizasse adequadamente, e em resumo temos hoje direitos “de mais” e deveres “de menos”. É angustiante constatar que por mais que os empregadores busquem cumprir a lei, pagando aos empregados todos os direitos “conquistados”, honrando acordos, convenções, e arcando com a elevada carga tributária que incide sobre a folha de pagamento, nenhuma segurança lhes é oferecida. Além disso o diploma é subjetivo e tem espaço para vasta gama de interpretações. Ou seja, na eventual/quase certa ocorrência de reclamações trabalhistas, ainda que absurdas e infundadas, são mínimas as chances de um desfecho razoável para os empregadores. 

Quem haveria de supor que os próprios recibos de quitação se tornariam a base sobre as quais as criativas pautas de reclamações trabalhistas seriam montadas? É uma indústria que só atrapalha o Brasil que quer dar certo. O triste é constatar como este movimento vem sendo impulsionado por profissionais inescrupulosos da área do direito, e até por juízes mal preparados ou mal intencionados, como vergonhosamente publicado nas páginas dos jornais em passado bastante recente. 
Diz-se na seara trabalhista que o reclamante tem duas possibilidades: ganhar, ou não perder. 

Da década de 40 até o ano de 2015 a justiça recebeu 84,5 milhões de processos trabalhistas. Destes, 80 milhões foram julgados. O resíduo, de pouco mais de 3,6 milhões, está em equilíbrio dinâmico, pois anualmente cerca de 3,5 milhões de processos são julgados e outros tantos ingressam. As ações se arrastam em média por 5 anos, e custam R$ 80,00 (oitenta reais) por habitante do país. Se estes números impressionam, o que dizer das dezenas de bilhões de reais pagos em indenizações no período de 2005 a 2015? Que ganho social trouxeram? 

O "problema trabalhista" é conhecido de todos, mas o passivo oculto advindo das ações julgadas é absolutamente imprevisível, pois as ações indenizatórias podem chegar a valores estratosféricos. Não há quem não saiba, ao menos de um caso, de empresas que sucumbiram em decorrência de onerosos processos trabalhistas. E se o imbróglio jurídico tem trazido uma avalanche de questionamentos nos perímetros das cidades, no meio rural os problemas se agigantam, pois a lei feita para o trabalho urbano vem sendo aplicada ao trabalho rural sem nenhuma adaptação, apesar das grandes diferenças existentes entre um e outro.

Consideradas ainda as crises política, financeira, de confiança, moral e cívica que ai estão, fica fácil entender a estagnação econômica que o país atravessa e até mesmo os crescentes índices de desemprego.

É chegada a hora de enfrentar com coragem a reforma da legislação trabalhista brasileira. O momento é mais do que propício, mas somente um esforço orquestrado permitirá extirpar a subjetividade e a necessidade de interpretações, mantendo direitos e não precarizando as relações de trabalho. Segurança jurídica, transparência e clareza são atributos fundamentais para que o setor produtivo possa reduzir custos, elevar a competitividade, manter e criar empregos, e assim promover a verdadeira inclusão social.

Isso apenas acontecerá se tanto o setor produtivo quanto a sociedade compreenderem o que está sendo proposto, e se propuserem a participar para que o texto seja aperfeiçoado, aprovado e amplamente aceito.

Ao setor privado cabe intensificar as discussões nas entidades de representação, quer sejam sindicatos, cooperativas ou associações. Concomitantemente, fazer com que as informações corretas cheguem a quem de interesse e para a sociedade como um todo. Não é raro observar comportamento esperneante daqueles que não se dão ao trabalho de conhecer a matéria, ainda que minimamente, antes de criticar. Neste desafio, o papel da imprensa é mais do que crucial.

Não se trata mais da defesa dos interesses de um ou de outro setor, por mais legítimos que possam parecer. O que está sobre a mesa é o resgate do projeto da Nação chamada Brasil. E ainda que vencida a batalha, não estará ganha a guerra. Há na esteira outras importantes reformas das quais o país precisa para voltar a crescer. Seguir reunindo forças para empreendê-las será, no mínimo, uma demonstração de maturidade e inteligência. 

A oportunidade está batendo à porta. Para dentro das nossas fronteiras as mudanças representam a renovação da esperança; e para fora delas, a redenção. Está nas mãos dos brasileiros tirar de vez o país das páginas policiais dos cadernos de notícias. 

Está na hora de o Brasil voltar a escrever a sua História, e com H maiúsculo.

ABAG/RP